#DuikWorthIt: “Seja incômodo, seja bravo, seja chato. Ajude-me!”
Duik é uma ferramenta fantástica. Esteve muito presente na última década da minha vida profissional. Quando precisei criar animações com personagens, quando quis fazer animações de maneira mais prática utilizando as ferramentas de automação, quando criei os meus produtos de criação de personagens. Eu sempre ficava me perguntando, o que levava o criador, Nico Duduf a criar uma ferramenta tão complexa e disponibiliza-la de maneira gratuita.
Agora em uma nova fase, estou desenvolvendo também uma ferramenta, e o Duik novamente se mostrou útil, pois sendo open-source pude consultar o código-fonte para entender e aprender sobre criação de scripts no After Effects.
Visitando o perfil no Twitter do criador, justamente para tentar iniciar um diálogo para de alguma maneira agradece-lo pelo trabalho feito até então, me deparei com um artigo já antigo de 2018, que me desconcertou, de várias formas.
Em um só texto, pude descobrir o que faz com que Nico se mantenha motivado a desenvolver essa ferramenta de maneira gratuita, descobri a quantidade absurda de downloads que essa ferramenta tem diariamente, e em contra-ponto, fiquei sabendo (ao menos na época em que o artigo foi publicado) que mesmo com a quantidade gigantesca de usuários da ferramenta, Nico estava, por assim dizer, quebrado financeiramente.
Eu mesmo, a muito tempo atrás doei para o projeto alguns meses durante a euforia de ver meu primeiro pacote de personagens (feitos com auxílio do Duik) dando algum dinheiro, mas logo depois cancelei o apoio, não lembro ao certo porque.
Fiquei realmente incomodado. Como pode uma ferramenta pode ser tão útil, ser utilizada tão largamente e a comunidade que a utiliza não ser capaz de trazer ao seu criador o mínimo de conforto financeiro.
Confesso que não sou tão evoluído socialmente a ponto de estar disposto a me doar a uma causa como ele fez e faz, mas em sua generosidade ele apresentou alguns caminhos para fazer a diferença que me pareceram o mínimo que eu poderia fazer para retribuir o que sua ferramenta vem me proporcionando. O fato é que nunca conseguirei retribuir inteiramente, mas vou me esforçar para fazer a minha parte.
Se você é usuário do Duik, leia o artigo dele. Eu o traduzi para o português porque ele me pediu pra fazer isso em seu texto, e achei que estava ao meu alcance. E também porque sei que existem muitos usuários no Brasil e em países de língua portuguesa.
Independente de diferenças ideológicas, entenda que você pode fazer a sua parte para um mundo melhor. Apoiar o Duik é só uma delas.
Meu raciocínio foi um tanto bobinho, mas me ajudou a dimensionar o quanto eu poderia ajudar com o projeto: Eu sou um Motion Designer, eu gosto do que eu faço e utilizo o Duik em meu trabalho. Não é justo eu pagar mais pelo Netflix, que é um serviço de entretenimento que eu uso eventualmente do que pro Duik, que é uma ferramenta fantástica que me acompanha a uma década.
Pense em sua realidade. Como o próprio Nico fala, ele gostaria muito que houvessem mais apoiadores doando menos. Se você tem um cartão de crédito internacional e a ferramenta é útil pra você, porque não doar pelo menos 1 dólar? É só clicar no link abaixo.
Quem sabe nós Brasileiros não possamos mostrar para o Nico que admiramos o que ele tem feito para um mundo melhor, e faça essa mensagem chegar junto a uma imensa onde de pequenas contribuições acompanhadas pelo hashtag:
#DuikWorthIT.
Faça a sua parte! Caso não tenha condições, faça o que está ao seu alcance, compartilhe esta mensagem com seus colegas que também utilizam a ferramenta. Não é necessário compartilhar meu site ou creditar a autoria da tradução, apenas copie e cole o texto se for o caso. Vamos fazer disso uma campanha!
Talvez o Nico veja esse movimento e pense “Nossa! Esse cara não entendeu nada!”, mas esta foi a minha maneira de contribuir.
Abaixo, a tradução na integra. Um grande abraço!
Imagem do artigo original, direitos Duduf Blog.
Atenção! Este artigo é altamente político, se você não gosta deste assunto, ou se você não quer ter nenhuma ideia de como será seu futuro e o futuro de seus filhos, pare de ler agora mesmo. Ou então, na pior das hipóteses, você vai desperdiçar alguns minutos preciosos. No melhor cenário, isso pode mudar o mundo.
Quando eu comecei a desenvolver meus próprios softwares para tornar meu trabalho com animação mais fácil, eles eram apenas minhas ferramentas e nada mais. Eram de uso privado e tornavam a minha vida melhor, isso não tinha impacto na vida das pessoas. Bem, para ser honesto, como eu não trabalho sozinho, rapidamente eles começaram a ter um pequeno impacto na vida dos meus colegas, simplificando os processos deles também.
Então eu decidi que podia compartilhar estas ferramentas com o resto do mundo, caso houvesse interesse. E havia. A minha ferramenta mais conhecida, Duik, é agora (no início de 2018) baixada 1.000 vezes por dia, ou algo em torno disso. Sair do privado e ir para o público politizou estas ferramentas.
“Tudo é uma questão de escolhas.”
Meu idealismo me deixou encurralado.
O que eu iria fazer? Eu tinha um novo produto, eu poderia simplesmente vendê-lo, como acontece com todo o resto em nossa sociedade capitalista, ou melhor ainda, eu poderia aluga-lo e manter meus clientes como reféns. Mas eu tive um momento singular para pensar sobre o meu impacto no mundo. Existem muitas coisas que eu não gosto em nossa sociedade: individualismo, consumismo, competição… Tudo está conectado, entrelaçado. Economia, política, são apenas mecanismos. Por nossa sociedade ser capitalista, isso torna as pessoas individualistas, competitivas e consumistas. É como as coisas são. A questão é: o que aconteceria se nos tornássemos conscientes em relação a isso? Se seguíssemos outros caminhos?
Eu escolhi dar de graça minhas ferramentas. Eu escolhi deixar as pessoas escolherem se valia a pena pagar por elas.
Eu escolhi fazer as coisas de maneira menos tradicional, talvez até de uma maneira rara: Eu escolhi dar de graça minhas ferramentas. Eu escolhi não ganhar dinheiro com elas, ou pelo menos, deixar as pessoas escolherem se valia a pena pagar por elas. Escolhi liberdade, para mim mesmo, e para o resto do mundo. Eu escolhi disponibilizar o código-fonte, deixar minhas ferramentas open-source, eu escolhi deixar as pessoas pegá-las, usa-las e modifica-las livremente, ao invés de ficar me preocupando com pirataria. Escolhi fazer meus produtos disponíveis até mesmo para o ser humano mais pobre da face da terra. Porque penso que minhas escolhas podem ter um impacto. Porque eu penso que se eu lutar contra o capitalismo e o consumismo, se eu mostrar um caminho diferente, este caminho pode ser seguido, e talvez, apenas talvez, este seja um passo para o que eu penso ser um mundo melhor. Política, isso é apenas política.
As pessoas topam um monte de coisas para que possam consumir, mas se elas tiverem escolha, elas não compram. Elas apenas consumem.
O que eu não sabia é que a maioria das pessoas não escolhem nada – e eu pertenço a este grupo, eu não me considero diferente daqueles que estou descrevendo. A maioria das pessoas – inclusive eu, como já dito – são consumidores. Se os softwares são gratuitos, a maioria das pessoas apenas pegam, consomem, pedem por mais features, pedem por ajuda, pedem suporte, mas nunca ajudam. Esta é a nossa sociedade capitalista. isso é mecânico. As pessoas não escolhem pagar por algo que é gratuito, elas não escolhem contribuir com o desenvolvimento de suas próprias ferramentas. As pessoas aceitam pagar quando tem que pagar, também aceitam ter sua vida invadida por publicidade, aceitam desistir da sua própria privacidade para poder consumir. As pessoas topam um monte de coisas para que possam consumir, mas se elas tiverem escolha, elas não compram. Elas apenas consomem.
Seria muito mais fácil eu simplesmente vender minhas ferramentas. Seria mais fácil não dar o poder de escolha as outras pessoas. Mas eu escolhi o caminho difícil. Eu sei que a maioria das pessoas não entendem isso, mas eu não me arrependo da minha escolha, e eu faria tudo de novo, mesmo sabendo que eu poderia ser mais rico do que eu possa se quer imaginar.
Números.
Voltando a realidade.
É um fato: todos nós somos apenas consumidores. Sei disso porque tenho consciência sobre minha realidade: Eu estou usando um monte de softwares gratuitos, serviços gratuitos, para os quais eu não contribuo nem doo. Também sei disso porque tenho acesso aos números por trás do meu famoso software.
1.000 downloads por dia, mas muito pouco apoiadores em proporção.
Duik é um tremendo sucesso. Centenas de milhares de downloads até então (nos últimos 5 anos), e uma média de 1.000 downloads por dia, mais de 10 mil usuários diários.
É um tremendo sucesso, com muito pouco apoiadores. 250 apoiadores durante cada campanhas de financiamento coletivo, 120 apoiadores no Patreon (e com certeza esses grupos se sobrepões, não há como sabermos os números). Para milhares de usuários cuja maioria não contribui com nada (Isso só torna os apoiadores ainda mais fantásticos, não há como agradecê-los o bastante caros apoiadores!). Seria muito mais preferível que houvessem mais apoiadores doando menos.
É um tremendo sucesso, mesmo com tão pouco contribuidores. Eu desenvolvi e escrevi 99% do código do Duik. Existem três outros contribuidores para alguns features e programação, cinco pessoas que ajudaram a traduzir para outras línguas além do francês e inglês. São oito contribuidores no total, e eu me considero um cara de sorte (para estes também, não posso agradecer o suficiente).
É um tremendo sucesso mas eu ainda estou tendo problemas com dinheiro. Eu sei que todo mundo tem problemas financeiros, mas pelo menos 70% das pessoas no meu país ganham mais que eu, e eu trabalho uma média de 50 horas semanais, 6 a 7 dias por semana. Apesar do fato de que o que eu faço é útil – e necessário – para as pessoas. Nossa sociedade capitalista é assim, nós não recompensamos as pessoas que fazem coisas úteis, nós valorizamos produtos baseados em um valor abstrato de mercado, é assim que o capitalismo funciona. Criar algo útil não pode ser nosso objetivo caso queiramos sobreviver. Nós temos que desenvolver um negócio ao redor disso, ou… fazer outra coisa da vida.
Centenas de usuários, talvez milhares, curtiram minhas últimas postagens nas redes sociais, elas foram visualizadas por milhares e compartilhadas por dezenas – mais do que todos os apoiadores e contribuidores que eu jamais tive. Mas eu estou lúcido, você provavelmente é um dos 10% ou talvez menos que leram esta postagem.
Todos nós somos apenas consumidores.
Conclusão: Todos nós somos apenas consumidores.
Consuma menos, contribua mais.
Faça política.
Mas eu não estou chateado, não estou desanimado. Obviamente, o que eu faço não é por dinheiro.
Mas eu não estou chateado, não estou desanimado. Só porque eu fiz as coisas de maneira diferente, pensei de maneira diferente, cheguei a resultados diferentes. Obviamente, o que eu faço não é por dinheiro – mas infelizmente dinheiro é necessário, e eu estou sem grana.
Porque eu faço tudo isso? Porque tanto esforço? Porque eu escolhi não ser apenas um consumidor, mas quis ser um contribuidor. Não quero consumir a vida, quero contribuir para a sociedade, porque acredito que a sociedade precisa disso. Não estou esperando que alguém me venda o que eu preciso, estou tentando construir o que eu preciso e então compartilhar isso, antes que alguém venha e venda isso. Eu quero ser capaz de explicar o que eu fiz para a sociedade, e ter orgulho disso. Ao vender meus softwares eu não seria um contribuidor à sociedade, mesmo se eles fossem necessários e bem sucedidos, porque isso não direcionaria a sociedade no caminho que eu penso ser a direção certa. Isso apenas me traria a sensação de que fiz algo que importa, mas não seria realmente útil para a comunidade. Não é o bastante fazer coisas úteis, o importante é o que fazemos com estas coisas, como nós as fazemos, como nós as compartilhamos. Este é o meu ponto de vista, e isso importa. É importante que eu tenha um ponto de vista, é importante que eu fale sobre isso em voz alta, bem alta. É importante para mim que a criação de softwares gratuitos seja um gesto politico, porque isso significa que estou contribuindo para a comunidade, porque isso significa que eu me perguntei um monte de questões sobre o que eu estou fazendo e como isso impactaria o próximo.
Não quero ser como nenhum outro consumidor.
Afinal de contas, não, não sou como nenhum outro consumidor. Sou orgulhoso de ser um contribuidor. Um contribuidor para a comunidade. É um esforço, é mais difícil que ser apenas um consumidor, é menos recompensador no curto prazo, mas muito mais no longo prazo, porque posso ter orgulho. Não rico, mas legitimamente orgulhoso.
E por fim, o que quero que você saiba é que não é assim tão difícil. Por favor, junte-se a mim! Eu entendo que você pode não ter tempo para criar coisas como eu fiz, claro, tive sorte de ser capaz de fazer isso, tive a sorte de nascer onde nasci, de ter um pouco de tempo livre em alguns momentos da minha vida, de ter tido uma boa educação… Mas não foi apenas sorte, foram também escolhas. Escolhas políticas, escolhas que impactam outras pessoas, escolhas éticas, para o melhor.
Todo mundo pode questionar, todo mundo pode ficar zangado com as coisas, todo mundo pode pensar sobre individualismo e consumismo. Todo mundo pode – e tem que – ficar descontente com nossa sociedade. Todo mundo pode fazer política.
Estou cansado de me sentir parte de uma minoria. Me ajude!
Talvez você já esteja tentando mudar o mundo à sua maneira, ou talvez você não saiba como fazer isso. Apenas espero que vocês todos pensem sobre isso agora, é isso que eu estou pedindo. Faça as coisas de maneira que elas importem e pense sobre como elas podem importar. Faça o que está ao seu alcance, nem mais, nem menos. Nós somos pessoas o suficiente no mundo para trazer mudança a sociedade. Por favor, estou cansado, preciso que você se junte a mim!
Existe muitas maneiras concretas de contribuir mais e consumir menos, mesmo sem ser um especialista.
- Acima de tudo, pense sobre o que você está fazendo e como pode fazer isso de uma maneira que importe. Seja político.
- Faça escolhas. Não deixe que o sistema faça escolhas por você. Tudo o que você faz merece que você se pergunte: “Como eu posso fazer minhas coisas de uma maneira melhor? Existe alguma alternativa à consumir este produto ou serviço?”.
- Seja intransigente caso saiba que o que você está fazendo fará com que as coisas sejam melhores. Não há detalhes, cada pequena coisa importa, há tanto para lutar, e tanto onde estamos perdendo, devemos ser intransigentes.
- Não espere que alguém venda o que você precisa, tente e construa isso quando for possível. E acima de tudo, compartilhe quando estiver pronto.
- Não faça as coisas apenas para você mesmo. Certamente existe alguém que tem as mesmas necessidades que você. Se pergunte: Como posso compartilhar com estas pessoas, mesmo que elas não tenham dinheiro.
- Aprenda. Para desenvolver o Duik, tive que aprender a programar. Eu não sabia nada sobre ciências da computação antes de tentar desenvolver minhas ferramentas, não aprendi isso na escola. Tudo o que você aprende é um gesto político também. Quanto mais você aprende, mais impacto você pode causar.
- Ensine. Ajude outros a aprender. É mais fácil quando você não está sozinho, eu aprendi muito mais ao ensinar do que quando estava na escola.
- Use seu idioma, talvez você possa traduzir conteúdos para torná-los disponíveis para mais pessoas (quem sabe você possa traduzir este artigo?).
- Você é um usuário, quem sabe você possa dar algum feedback construtivo, não baseado no que você quer ou precisa, mas pensando sobre o que a comunidade pode precisar baseado na sua experiência.
- Contribua financeiramente para projetos que importam (que tenham impacto, que direcione a sociedade para o caminho que você pensa ser o correto, não tanto pelo que fazem, mas como fazem isso). Isso é muito necessário já que a nossa sociedade não recompensa as coisas baseada em seu impacto, mas apenas em seu valor de mercado.
- Seja um exemplo, espalhe a palavra, convença pessoas, compartilhe este artigo, exatamente como estou fazendo agora. Cada ato público é político e merece ser discutido. Seja incômodo, seja bravo, seja chato.
- Etc.
Eu não poderia fazer e compartilhar o que eu faço gratuitamente sem o seu suporte. Ajude-me no Patreon! Obrigado.